segunda-feira, 30 de junho de 2008

Big Sur 6







Embora a cabana de Monsanto tenha defeitos como o facto de não haver redes nas janelas para impedir que as moscas entrem durante o dia mas apenas grandes portadas de madeira, de maneira que nos dias enevoados quando o tempo está húmido se as deixo abertas fica demasiado frio, se as deixo fechadas não se vê nada e tenho que acender o candeeiro em pleno dia - Mas à parte isso, não tem mais defeitos - É tudo magnífico - E a princípio é tão espantoso poder gozar tardes celestiais em prados de urze no outro extermo do desfiladeiro e a escassos oitocentos metros da cabana posso também apreciar uma súbita paisagem costeira, selvagem e melancólica, ou se estiver farto destas duas alternativas posso ainda sentar-me junto ao riacho numa clareira e meditar de olhos fitos nos ramos de árvore submersos - É tão fácil na floresta sonhar acordado e invocar os espíritos do lugar dizendo «Autorizai-me a permanecer aqui, eu só quero sossego»...

in Big Sur, Jack Kerouac

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Vanishing Point



Vanishing Point é o filme americano perfeito para 1971. Kowalski é um perdedor, ex-fuzileiro no Vietname, ex-piloto de provas e ex-policial, expulso da corporação com desonra. Ele tinha uma namorada surfista que se afogou no mar, e agora é um entregador de carros que aceita levar um Dodge Challenger 1970 de Denver, no Colorado, para São Francisco, na Califórnia. Kowalski tem 15 horas para ganhar uma aposta e vai para a estrada. Vanishing Point é um road movie. Um filme B, de orçamento barato, despretencioso e clássico. Kowalski dirige dia e noite, tomando benzedrina e lembrando do que deixou para trás; a namorada antes da morte inexplicável, fracassos e uma vida sem sentido.

Nada parece justificar a motivação da personagem. É mais do que uma aposta e Kowalski sabe disso. A sua vida está naquela estrada, por isso ele segue em frente, sem respeitar limites de velocidade, ordens e barreiras montadas para detê-lo, inutilmente. Kowalski acelera e passa a ser alvo da polícia rodoviária, que o persegue de um estado para outro. No caminho, dá de cara com o que sobrou do sonho libertário da década anterior: hippies místicos pregando no deserto, uma motoqueira nua e misteriosa, um vendedor de cobras que o ensina a sair do deserto de Nevada, quando fica sem gasolina, e um DJ de uma rádio local. Super Soul é negro e cego, outro segregado na América de sonhos e oportunidades que não se realizaram - como Kowalski. O DJ capta pelo rádio as ordens policiais contra Kowalski, e passa a orientá-lo sobre todos os passos dos tiras raivosos e frustrados que estão na sua captura. O DJ dedica músicas a Kowalski e fala aos seus ouvintes sobre "a última alma livre de todo o planeta, o último herói livre da América, o centauro elétrico caçado pelos azulões fascistas e corruptos".

A polícia descobre que a sua primeira suspeita é infundada. O carro de Kowalski não é roubado. Super Soul pergunta: O que ele quer provar agora? Kowalski não quer provar nada. Não há o que provar em um jogo perdido, mas é preciso ir até o fim. A mídia interessa-se pela perseguição e passa a acompanhar o caso. O DJ é entrevistado, defende Kowalski e sua estação de rádio é destruída por policiais. Na última transmissão, Super Soul entende o “desejo de velocidade do infrator como a condição de liberdade da alma”. Perto de São Francisco, a polícia monta uma barreira na estrada com motoniveladoras, viaturas, helicópteros e um imenso aparato para pegar Kowalski. Jornais e emissoras de todo o país também estão presentes, além de uma infinidade de curiosos. Kowalski diminui e encara o espetáculo que está à sua espera. Ele não tem saída, é o que todo mundo pensa. É o ponto alto do filme.

A metáfora para o início dos anos 70 na América é perfeita: o fim do sonho no meio de uma guerra distante, além dos conflitos interiores de um desajustado – sempre uma personagem interessante na ficção norte-americana. Os 60 fracassaram, como Kowalski – e não era hora de um individualismo tão inesperado e transgressor. Ninguém sabia o que poderia acontecer depois da turbulência dos sixties. Vanishing Point é o lado B de Easy Rider, dirigido por Dennis Hopper em 69, e de Zabriskie Point, de Michelangelo Antonioni, de 70 – que já tinha feito Blow Up em 66. É o cinema que colocou o ponto final nos anos 60.

in Edonkers

terça-feira, 17 de junho de 2008

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Verdeazulvermelhonegro








verde azul
vermelho negro

verde vale
azul mar
vermelho deserto
negro asfalto

asfalto verde
vale negro
mar vermelho
deserto azul

azul asfalto
deserto verde
mar negro
vale vermelho

mar de asfalto
num vale deserto sem cores

terça-feira, 3 de junho de 2008

No deserto vermelho...



No deserto vermelho vejo cactos lilazes
escorpiões rastejantes
areias deslizantes

No deserto vermelho vejo sombras alaranjadas
cogumelos venenosos
viajantes silenciosos